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sábado, 16 de julho de 2011

FESTIVAL DE FÉRIAS - A VILA

Mais um sabadão e hoje a dica é assistir um filme muito subestimado por grande parte do público, infelizmente, mas que merece uma revisão para quem sabe mudar a opinião daqueles que simplesmente classificam como lixo um dos melhores filmes produzidos nos últimos anos. A Vila (2004) é uma daquelas obras que podem não ser bem compreendidas na época de seu lançamento, mas certamente atravessará os anos em boa forma e levando sua mensagem reflexiva para novas platéias. Digna de verdadeiros estudos para dissecar a fundo seu excelente roteiro, esta produção também pode gerar interpretações diversas se analisarmos o estilo do diretor, M. Night Shymalan, e o que os espectadores esperam ver em um trabalho seu. É justamente aí que o caldo entorna: o público tem uma visão singular do cinema deste cineasta e ele, por sua vez, não quer se prender a um estilo, ou melhor, joga a isca vendendo seu peixe apostando no que deu certo uma vez, o suspense, mas sempre adota um viés diferente para contar suas histórias fantásticas.

Shymalan causou frisson com O Sexto Sentido e as platéias se acostumaram a ligar seu nome a filmes de suspense que realmente pegam quem assiste de calças curtas, apesar de que após o estouro da história do menino que via pessoas mortas, seus trabalhos seguintes não atingiram mais aprovação unânime por parte da crítica e do público e alguns foram duramente massacrados, inclusive nas bilheterias. No caso do filme em questão, as pessoas esperavam encontrar elementos sobrenaturais, sequências de cenas dignas de cinema independente e, claro, um final inesperado. Sim, todos estes elementos estão aqui, mas a narrativa lenta e a conclusão típica de filmes-cabeça desagradaram os seus fãs, além do fato da reviravolta surpresa acontecer gradativamente da metade para o final, o que esvazia as expectativas de um final avassalador. O cineasta usou um pequeno vilarejo do começo do século 19 para fazer um estudo sobre como o medo pode afetar a vida das pessoas, inclusive levando-as a cometer verdadeiras loucuras para se preservarem. Para tanto, ele inicia sua história de forma intrigante cujo ápice não demora a acontecer, abrindo assim caminho para um novo estilo entrar em cena. Um drama reflexivo praticamente toma conta das quase duas horas de projeção, mas os segredos do roteiro vão sendo pouco a pouco revelados até que as últimas cenas chegam para impor uma crítica à sociedade atual, cada vez mais fechada em seu mundinho.


A pequena vila parece um lugar tranquilo e alegre e todos os habitantes se dão bem, são religiosos e educados e gostam de confraternizações, porém ninguém se sente totalmente seguro já que o local só existe por causa de um acordo feito com os monstros que habitam a floresta que cerca o vilarejo. Um descuido e o pior pode acontecer. Assim, a população frequentemente faz oferendas de comidas para os chamados "Aqueles de Quem Não Mencionamos", ninguém deve atravessar o matagal e a cor vermelha é terminantemente proibida, pois isso atrairia os seres malignos. Porém, alguém desobedece. Um determinado homem, Lucius Hunt (Joaquim Phoenix), decide enfrentar o desconhecido por uma nobre causa, mas não se preocupou no fato de que esse ato mudaria para sempre o futuro dessa vila. Certa noite, o caos toma conta do local. O sinal de alerta é tocado e o mistério é revelado em sequências perturbadoras e angustiantes. Passada a fase dos sustos, livre de efeitos especiais gritantes ou artifícios gratuitos para causar medo fácil, entra em cena uma segunda etapa do roteiro. Se antes os tais monstros eram as estrelas, agora é a vez de o elenco brilhar.

Hunt se aproxima de Ivy Walker (Bryce Dallas Howard), uma jovem com deficiência visual, mas com muita coragem e bom coração. Ela acaba atraindo a atenção do desequilibrado Noah Percy (Adrien Brody), mas o amor do rapaz o faz cometer uma loucura. Ele fere gravemente o pretendente de seu objeto de amor platônico e a moça decide enfrentar o desconhecido e ir buscar ajuda na cidade que fica após os limites da floresta. Sua atitude corajosa e o fato de ser cega fazem com que Edward Walker (William Hurt), o líder local, passe valiosas instruções para ela conseguir cumprir a travessia. A partir daí, os segredos que envolvem a fundação do vilarejo vão sendo dissecados e as peças vão se juntando na cabeça do espectador levando-o a compreender o final que, passado o impacto negativo que pode provocar em um primeiro instante, convenhamos, é muito provocativo e conclui com inteligência um dos melhores roteiros dos últimos tempos. Para quem gosta de ser surpreendido, uma excelente pedida. Já para aqueles que preferirem ver o enredo pelo viés do excêntrico triângulo amoroso, a decepção deve ser eminente.


Infelizmente, Shymalan teve que amargar a decepção deste filme ter fracassado em termos de público e até hoje ser um fantasma que o persegue. Uma verdadeira injustiça. Com uma narrativa que transita muito bem do suspense para um drama poético e sustentado por atuações brilhantes, o longa tem uma mensagem contundente e contemporânea e todos devíamos refletir sobre o assunto. O mito das criaturas misteriosas com a finalidade de confinar a população em um determinado local pode ser transportado facilmente para a nossa realidade, pois hoje muitas pessoas se fecham em suas casas com medo da violência. O vilarejo é como uma variação de um condomínio fechado, atual sonho de consumo de milhares de pessoas. Tudo que se precisa para sobreviver e ter conforto está a disposição lá dentro, salvo raras exceções, e não é necessário sair para fazer mais nada e assim você se preserva, ou pelo menos vive na ilusão de que está fazendo isso. As críticas ferrenhas a este trabalho, sinceramente, só podem ter sido feitas por pessoas despreparadas, mas não se pode culpá-las. É natural que com um nome de peso por trás das câmeras e que, sem querer, com um único filme definiu seu estilo, gerasse expectativas que, no caso, não foram correspondidas. Agora que o cineasta entregou produtos realmente críticos, como A Dama na Água e Fim dos Tempos, é possível se fazer uma análise mais correta e justa de A Vila. Aproveite as férias para rever seus conceitos e tente assistir esta interessante experiência cinematográfica livre de amarras e conceitos previamente definidos.

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