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quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

FESTIVAL DE FÉRIAS - EM UM MUNDO MELHOR

Escolher um título para um filme não é uma tarefa fácil. É preciso em poucas palavras expressar a idéia principal da produção ou ao menos deixar o público instigado a assistir. Assim, existem títulos muito originais, outros horríveis, alguns enigmáticos e também aqueles que vendem gato por lebre, mas nem sempre isso é de propósito. Em Um Mundo Melhor (2010) é um bom exemplo disso. Vende a idéia de um draminha edificante e isso ele até é, mas o conteúdo é apresentado de forma desagradável para aqueles que buscam mensagens positivas em histórias que se passam em ambientes bonitos, coloridos e que tenham um casal feliz no centro das atenções no final ou criancinhas que chegam ao mundo para fazer o bem. A utopia do mundo melhor é o que motiva um dos protagonistas desta trama que confia que um dia os seres humanos passarão a ser mais corretos, respeitosos e éticos, mas sabe que o caminho para chegarmos a esse paraíso na Terra não é fácil e tampouco rápido. Ou se não sabia, acabou descobrindo dentro da própria casa e círculo de relacionamentos.

Anton (Mikael Persbrandt) é um médico que trabalha em um campo de refugiados na África, mas quando pode ter folga volta para seu país natal, a Dinamarca. Ele tem dois filhos com Marianne (Trine Dyrholm), de quem está se separando, embora contrariado. Elias (Markus Ryggard), seu filho mais velho, sofre com a perseguição no colégio de um garoto maior que ele que se aproveita para humilhá-lo como pode. As coisas mudam quando ele conhece Christian (William Johnk Nielsen), um menino que perdeu a mãe recentemente e agora vive com o pai, Claus (Ulrich Thomsen). Ele acaba de ingressar no mesmo colégio que Elias, mas não se comporta como um novato na turma. Geralmente os recém-chegados se mostram tímidos e um ótimo alvo para chacotas e brincadeiras cruéis, mas com ele a banda toca de outra maneira. Após defender seu novo amigo em uma confusão, Christian é agredido e como vingança dá uma surra no agressor e o ameaça com uma faca. Assim, os garotos criam um forte laço de amizade, mas um episódio com possíveis consequências trágicas pode colocar essa relação em risco assim como suas vidas. Cabe aos pais de cada um ajudá-los a compreender a complexidade das emoções humanas e os desdobramentos dos atos realizados.

Christian e Anton tentam cada um a seu modo construir o tal mundo melhor do título. O garoto retraído na verdade é rancoroso, pois acha que a vida não foi justa com ele por causa da morte da mãe e culpa seu pai por isso também. Sem responsabilidade alguma, ele extravasa sua raiva do mundo tentando defender aqueles que sofrem, no caso seu amigo da escola, porém, combatendo utilizando também a violência. Já o médico passa muito tempo cuidando de necessitados que vivem em situação de miséria total. Seu ato é muito bonito, mas tanta dedicação ao trabalho acabou não lhe proporcionando a melhor vida pessoal possível. Sua esposa está descontente com a relação e quer se divorciar. Seu filho sofre bullying na escola, uma prova de que a maldade já nasce com todos nós, cabe a cada um saber lidar com ela da melhor maneira possível. Anton, sempre a favor da paz, aconselha a nunca revidar uma agressão e nem mesmo quando leva um tapa do pai de uma criança com quem seu caçula brigava ele esboça uma reação mais exaltada. Seu lema é "ele bate, você revida e assim começam as guerras". Faz sentido, principalmente para ele que vive cotidianamente com os resultados tristes de uma guerrilha, mas infelizmente no mundo atual soam apenas como palavras tolas.
A diretora Susanne Bier, que já havia tratado sobre consequências da guerra em Brothers e sobre as diferenças entre países do terceiro mundo e o cultuado território europeu em Depois do Casamento, suas obras mais famosas, aqui junta os dois temas com um verniz que faz com que nem todos consigam enxergar suas reais intenções. Ela foi ousada ao trazer para o mundo infanto-juvenil problemas que afetam a humanidade como um todo e não é de hoje. Por exemplo, a falta de respeito com seu semelhante em ambiente escolar pode ser manifestada pela necessidade de mostrar ao outro que ele tem de sentir medo de você e obedecê-lo. O alvo dos valentões geralmente são os estudantes retraídos ou que demonstram não aceitar algum defeito físico ou de personalidade. A esses casos hoje chamamos de bullying, mas apesar da palavra não ser usual antigamente o problema já existia. A autoridade e humilhações impostas por um jovem a outro são tão graves e sinais claros da degradação do conceito de sociedade quanto as ações de muitos governantes que permitem desigualdades sociais gritantes. É difícil de acreditar que a África mostrada no filme divide espaço com a imagem do mesmo país que conhecemos pela TV durante a Copa do Mundo de 2010. Luxo e lixo dividindo praticamente os mesmo espaços.

Vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 2011, muita gente não concorda com esta e outras premiações que exaltaram a produção. Quando vista sem prestar muita atenção realmente ela parece não dizer nada, mas é preciso se ater a narrativa para encontrar a força deste drama. Os personagens são verossímeis e perfis muito interessantes a serem analisados. Existe um contraste entre as atitudes de Anton e as ações descabidas de Christian que podem influenciar Elias, mas ambos ainda estão em fase de formação de caráter e podem ser salvos e quem sabe salvar o mundo, nem que seja apenas o território em que vivem. Em Um Mundo Melhor é um daqueles filmes feitos para momentos de concentração e para platéias que gostam de pensar, só assim para compreender as conexões que Susanne desejou estabelecer entre um país miserável e outro elitizado que vive de fachada, pois as mazelas também estão presentes por lá de uma forma ou de outra. Não adianta separar como área de negros e a outra de caucasianos de cabelos e olhos claros. Todos estão juntos em um mundo turbulento e perigoso, mas sonhamos com um possível mundo melhor. Se cada um fizesse sua parte para tanto...

Um comentário:

Equipe Cinema Detalhado disse...

Filme sério, pesado e intenso. Gostei demais quando assisti. Premiações justas no ano passado...

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