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quarta-feira, 19 de outubro de 2011

ESQUECERAM DE... DE CORPO E ALMA

Cada vez mais é comum produções de estilos diferentes de fazer cinema conseguirem alguma brecha no mercado para serem exibidas tanto nas salas de exibição quanto serem encontradas nas locadoras. Assim óperas, peças teatrais, filmagens caseiras e espetáculos de dança conseguiram ser transformados em médias e longas metragens. Uma pena que a maioria encontre um espaço mínimo para atingir seu público. Comuns nas mostras de cinema e encontrados depois em lojas especializadas em filmes de arte e cults, essas obras são verdadeiras raridades e passam despercebidas, sendo de interesse apenas a um pequeno grupo de cinéfilos. Nem quando um grande nome está por trás o trabalho vinga. Isso ficou provado com De Corpo e Alma (2003), filme praticamente desconhecido do cultuado e saudoso Robert Altman, diretor diversas vezes indicado ao Oscar. A produção entrou e saiu de cartaz e chegou ao mercado em DVD sem fazer barulho.
 
A obra fala sobre balé e é um projeto atípico na filmografia do diretor que na época não estava em uma fase muito inspirada, mesmo cerca de dois anos antes tendo recebido boas críticas e frequentando as premiações com Assassinato em Gosford Park. Misturando aulas de dança, ensaios, bastidores, a apresentação final e alinhavando algumas situações acerca da vida de uma das bailarinas, em uma primeira vez o filme pode parecer estranho e desinteressante. Porém, é um trabalho que merece respeito e deve ser considerado como uma audácia na vida profissional de Altman, trabalhando com um enredo que lembra a estrutura de filmes que fragmentam ao mesmo tempo em que unem as histórias de diversos personagens, algo que ele adora e manteve em toda a sua carreira. A diferença é que a dança, o espetáculo é elevado a categoria de protagonista.

A bailarina Ry (Neve Campbell) está ensaiando muito para um grande espetáculo de dança e quer agradar o diretor e líder da companhia, Alberto Antonelli (Malcom MacDowell), mais conhecido com Sr. A. Durante esse processo, a jovem se apaixona por Josh (James Franco), mas ao mesmo tempo em que o trabalho lhe trouxe um grande amor, sua dedicação extrema ao show a faz se distanciar dele. Bem resumidamente esta é a sinopse. O que chama a atenção neste projeto é a reverência à dança e como o diretor conseguiu transformar um fiapo de roteiro em uma história interessante, mesmo qua a maioria dos atores sejam na verdade bailarinos desconhecidos. Lembrando, é claro, que este é um produto para apreciação para um público seleto ou amante de artes e cultura.


Altman se uniu ao projeto com ele já encaminhado por Neve Campbell, que antes de ser atriz já se dedicava a carreira de bailarina. A idéia não parecia muito atrativa em termos de bilheteria, mas chamou a atenção do diretor a possibilidade de realizar um trabalho para um  nicho de público específico ao retratar uma comunidade fechada. Assim, com sua câmera atenta e respeitosa, ele conseguiu seguir os passos dos dançarinos e acompanhar um pouco de suas desilusões e alegrias, mas sem deixar que os dramas de cada um tomassem conta do roteiro. A equipe filmada faz parte do grupo Jofrrey Ballet de Chicago. Talvez por não ter conhecimentos a respeito de dança, o cineasta optou em apresentar as sequências de ensaio de maneira quase informal e caseira e até nas cenas de diálogos nos deparamos com um tom comedido e melancólico. Isso ocorre pela opção da meta-linguagem, ou seja, ao mesmo tempo em que retrata um ambiente sem glamour, competitivo e no qual o sucesso de cada um parece estar além de seu máximo esforço, o filme em si é frio, silencioso e com emoções praticamente nulas. Para quem tem paciência em acompanhar este trabalho com jeito de documentário, a recompensa vem no final com um espetáculo belissimamente filmado, com música e efeitos sonoros adequados e rico em cores reforçadas pela iluminação de primeira.

Infelizmente, nem mesmo os críticos se entusiasmaram com esta obra e a classificaram como mediana ou não tiveram medo de dizer que ela é desinteressante e totalmente descartável. Para aqueles que esperam ver um filme consistente, realmente a opção não é válida. Já para quem tem massa encefálica e sensibilidade suficientes para ver beleza e sentido em pequenas cenas que parecem desconexas a princípio, mas que formam um conjunto satisfatório no final, excelente pedida. Altman simplesmente revela o clima ora perturbador ora agradável dos bastidores de um espetáculo que tem que resultar encantador para as platéias e é exatamente essas as sensações que o espectador do filme tem. O incômodo sentido até pouco mais da metade de projeção é substituído por deslumbramento quando os bailarinos estão dando o seu melhor no palco. Claro que não espere o teor dramático ou cenas apoteóticas de danças como vistas em Cisne Negro, mas bem que alguma distribuidora poderia ter aproveitado o sucesso deste candidato ao Oscar para relançar De Corpo e Alma, mais uma produção interessante esquecida no limbo cinematográfico, apesar de que, exposta a idéia e estrutura do longa, não é difícil entender o porquê dele ter passado na surdina quando lançado e não ter deixado saudades ou marcas profundas. É a velha questão: a demanda é que dita a oferta.

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