Um diretor de
cinema pode escolher entre dois caminhos para definir seu trajeto profissional.
Pode optar por trabalhar com um ou dois gêneros constantes, criar uma legião de
fãs e marcar seu estilo ou atirar para tudo quanto é lado, ganhar seu
dinheirinho e viver no anonimato. Porém, alguns profissionais de trás das
câmeras conseguem transitar bem nos mais variados tipos de filmes, mas o
problema é quando o público petrifica uma imagem deles e passa a repudiar
qualquer “pulada de cerca”. Esse mal está sendo vivido por Peter Jackson que
virou um nome quente em hollywood após o sucesso da saga O Senhor dos Anéis, assim tornando-se um sinônimo de megaproduções
e efeitos especiais de ponta. Pouca gente sabe que ele começou sua carreira de
forma modesta, apostando inclusive no trash, e ganhou certo prestígio com o
drama Almas Gêmeas muito antes de
enveredar pela fantasia, mas é certo que a recepção pouco calorosa de Um
Olhar do Paraíso (2009) tem a ver com a expectativa que seu nome em um
projeto gera. Nestas férias uma boa dica é rever esta obra ou assistir pela
primeira vez, mas procurando focar atenção na história e não no currículo do
diretor.
A trama é narrada pela adolescente Susie Salmon
(Saoirse Ronan), um espírito do bem que habita os céus. Ela conta um pouco de
sua rápida passagem pela Terra, sua adaptação ao outro mundo, suas novas
descobertas e sobre como sua família superou sua perda. No início da década de
1970 ela estava voltando um dia da escola sozinha e por estar atrasada optou
por cortar caminho por uma região campestre. No meio do percurso ela encontrou
um de seus vizinhos, George Harvey (Stanley Tucci), um novo morador da região
que ela já tinha visto conversando com seu pai, Jack (Mark Wahlberg).
Inocentemente a garota acaba caindo em uma armadilha e teve sua vida
interrompida de forma brusca e precocemente. Após esta introdução, que de certa
forma é demorada, mas muito bem realizada, passamos a acompanhar a peregrinação
de Susie em busca da paz. Ela está tomando consciência do que lhe aconteceu,
não tem noção de como é a vida após a morte e ainda está apegada às lembranças
da realidade. Sempre viveu sobre as regras da moralidade e dos conselhos da
família e não teve tempo de viver um grande amor e tampouco ter uma profissão.
Sofre também vendo a dor de seu pai, da mãe Abigail (Rachel Weisz) e ainda se
preocupa com a irmã mais nova, Lindsey (Rose Mclver), que pode ser a próxima
vítima de seu assassino.
Calcado em situações dramáticas, Jackson traça
praticamente duas tramas paralelas que estão intimamente ligadas. Mostra o
empenho da família da jovem em desvendar os mistérios do caso e a luta para
superar a tragédia e ao mesmo tempo ele dá a sua visão dos céus. Os tons
pastéis predominam em todo o filme, mas é interessante observar que a realidade
sempre é pintada de forma mais melancólica enquanto a ambientação após a morte
é retratada com cores mais vivas, embora tenha se optado por um visual um tanto
artificial para este cenário. Esse cuidado com o uso dos tons ajuda a acentuar
a mensagem do longa, mostrando os humanos vivendo em um plano astral dos
piores. E olha que a época em que a história se passa é praticamente quatro
décadas atrás e nem mesmo uma bucólica e pequena cidade estava livre do perigo.
Fazer a transposição dos fatos para nossa realidade é uma forma de tirar o
melhor proveito deste filme. Muitos soltam os cachorros pelo fato do cineasta
ter feito um melodrama assumido, mas qualquer um que saiba a premissa já deveria
assistir com outros olhos e não esperando um espetáculo pirotécnico. O que para
muitos é uma decadência, para outros é motivo de aplausos ver que Jackson ainda
sabe contar uma boa e emocionante história sem precisar recorrer a efeitos
especiais e cenários megalomaníacos. É dessa forma que constatamos os bons
profissionais afinal quem sabe criar um mundo fantástico e repleto de criaturas
imaginárias deve tirar de letra retratar algo atual e que levanta discussões a
respeito de justiça e espiritismo. Para não se sentir um peixe fora d’água
Jackson encontrou um ponto de apoio na construção da ambientação do céu, assim
ele também conseguiu presentear o público com belíssimas e oníricas cenas e
fazer o que sabe melhor: colocar o espectador em uma realidade paralela.
Drama e fantasia se misturam de maneira
agradável tornando realidade um roteiro que facilmente poderia pender para o
dramalhão extremo, mas Jackson e suas colaboradoras Philippa Boyens e Fran
Walsh trataram de dar alguns momentos de respiro ao texto adaptado do romance
“Memórias de um Anjo Assassinado”, de Alice Sebold. É nítido que existe a
intenção de a todo instante emocionar o espectador e deixá-lo com o coração
apertado, mas ainda que Susie tenha seus momentos de extravasar sua raiva em
outros demonstra o que há de bom no tão sonhado paraíso graças a ajuda que
encontra de uma outra garota. Ok, não é fácil defender um trabalho cuja
proposta principal é fazer o púbico se esvair em lágrimas, algo pouco apreciado
hoje em dia em que o cinema está voltado a provocar barulho e imagens
impactantes, mas é estranho o alto número de críticas negativas à esta obra. No
conjunto o filme funciona bem, é aceitável o vai e vem de cenas que diferem o
mundo real do espiritual, com relevância à oposição feita entre o clima de
suspense e o de drama, e a introdução mostrando o cotidiano caseiro e certinho
da protagonista deveria ser repetido a exaustão para os adolescentes de hoje em
dia. O problema estaria onde? A resposta é Peter Jackson na cadeira de diretor.
Depois de três gigantescas e fantásticas produções que acumularam milhares de
fãs fica difícil para qualquer um surpreender, mas parece que o cineasta quer
seguir os passos de Steven Spielberg e alternar projetos grandiosos com outros
menores. Aliás, se alguém que já viu esta obra sentiu um acentuado “estilo
família” no enredo não é a toa afinal o próprio homem que já levou aos cinemas
extraterrestres, dinossauros e tubarões assassinos é o produtor da fita.
Em suma, Um Olhar do Paraíso é um projeto que
não é a tragédia que pintam, mas tinha potencial para ser melhor. Tem um bom
texto, mas talvez exagere na sua concepção visual muito por conta do choque que
causa as diferenças entre a realidade e o paraíso, certamente uma opção
estética de Jackson e não falta de recursos. Todavia, o que há de mais incômodo
no longa são as interpretações. Saoirse está excepcional, mas o restante do
elenco deixa a desejar. Tucci teve em mãos o personagem que poderia ser um
divisor de águas em sua carreira, mas o trabalhou de maneira extremamente
intimista, porém, ainda assim merece elogios por construir um vilão livre de
estereótipos. Wahlberg também se sai bem como o pai desesperado em busca da
solução do caso e nos faz esquecer de algumas bobagens que andou se metendo. Já
Rachel Weisz e Susan Sarandon, esta que vive Lynn, a avó de Susie, têm aqui uma
de suas interpretações mais constrangedoras. Dessa forma, novamente caímos na
história de que Jackson é o problema do filme. Além das expectativas que seu
nome carrega, ele próprio parece estar obcecado pela idéia de criar imagens
marcantes e se preocupou mais em construir visualmente duas realidades opostas
do que investir em personagens críveis e em direção de atores. De qualquer
forma, uma opção boa para um passatempo e que ainda traz mensagens relevantes
que precisam ser resgatadas. O ditado “a curiosidade matou o gato” implícito na
introdução do longa parece coisa do tempo da vovó? Talvez ele nunca estivesse
tão atual quanto agora. Vale a pena compreender as mensagens do filme e transpor
à nossa realidade.
Um comentário:
Esse filme é uma montanha-russa: se Ronan e Tucci, ela mais, estão interessantes, todo o resto do elenco parece equivocado. as gosto de SUsan Sarandon, que, mesmo sem finalidade, está linda!
Mas Peter Jackson realmente deu uma erradinha nessa filme, hahahshaisa.
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