A adolescência é um período da vida no qual qualquer ser humano
está cheio de dúvidas e anseios e encontrar o equilíbrio entre o resquício da
inocência da infância e a maturidade forçada por uma sociedade cada vez mais
irracional é quase impossível. Aos olhos dos pais e protegidos dentro de seu
lar, em geral, os filhos são vistos de forma positiva, a criança que cresceu
bem educada e feliz, até porque a maioria já sabe usar muito bem os truques de
personalidade para persuadir. Porém, quando estão fora de casa as regras são
outras e os jovens gradativamente são levados a seguir caminhos torpes e como
estão na idade de se auto-afirmarem como pessoas fazer parte de um grupo bacana
na escola ou no bairro torna-se uma necessidade primordial. Ser você mesmo é
descartável, o importante é parecer com a turma que escolheu fazer parte, o que
implica certamente em mudanças de visual e de comportamento chegando inclusive
a atos de extrema crueldade contra semelhantes ou a si próprios. De anjinho da
mamãe à garota pervertida e problemática, a protagonista de Aos
Treze (2003) mostra de forma eficiente e econômica o processo desta
transformação, embora o roteiro seja baseado em episódios clichês já vistos em
outras produções que lidam com temas parecidos.
Tracey Freeland (Rachel Evan Wood) é uma adolescente aparentemente
exemplar. Aos treze anos ela é excelente aluna, boa filha e ainda mantém ativo
um irresistível jeitinho de criança, porém, ela já está se sentindo mal por ser
esnobada na escola pelas garotas mais populares, aquelas que estão sempre na
moda e chamam a atenção dos meninos. A chance de mudar esse quadro surge quando
ela consegue se aproximar de Evie Zamora (Nikki Reed), o modelo que ela
gostaria de seguir, mas o problema é que essa nova amizade não é uma boa
companhia e assim Tracey acaba sendo pouco a pouco persuadida a se envolver com
drogas, experimentar prazeres sexuais e até cometer pequenos crimes. As coisas
complicam quando tais atos deixam de ser curiosidade e se tornam rotineiros
desencadeando uma série de desentendimentos entre Tracey e sua mãe Melanie
(Holly Hunter), ainda mais quando Evie tem a ideia de tentar morar na casa da
nova amiga, claramente se aproveitando da relação em frangalhos que a jovem
mantém com seus familiares.
Ricos e pobres estão sujeitos a essas más influências, pois todos
sabem que a falta de dinheiro ou sua abundância causam transtornos, mas
historicamente filhos de famílias problemáticas são as principais vítimas de
amizades duvidosas, não que isso não tenha a ver com grana. Bobagens como não
ter posses para comprar uma roupa bacana para ir a uma festa ou o papai que
compensa seu distanciamento oferecendo dinheiro para o filho comprar o que
quiser no shopping podem tornar-se grandes problemas a curto ou a longo prazo. Com
pais separados, falecidos, ausentes ou que vivem juntos apenas por
conveniência, é comum que o adolescente insatisfeito busque apoio nas amizades
e quem lhe estende a mão primeiro certamente ganha sua inteira confiança,
tornando-se basicamente um jogo de dominação onde o mais forte geralmente não
tem coisas boas a oferecer e se aproveita da fragilidade do outro. É justamente
nas questões da família fragmentada e da possível vítima das circunstâncias que
se apoia o trabalho de estreia da diretora Catherine Hardwicke. A mãe de Tracy
é amorosa e não deixa faltar nada para a filha, mas talvez o fato de ser
separada e estar namorando um homem que não é um exemplo de ser humano de
sucesso provoquem na garota uma revolta que talvez só ela compreenda e sua
maneira de extravasar sua raiva é através de atos impensados como colocar um
piercing na língua ou trocar beijos com outra menina. Ela busca o choque para
atingir a mãe deixando-se levar pelas ideias ousadas e bizarras de Evie que
aparentemente não tem quem a repreenda. Aliás, se o longa apresenta muito bem a
aproximação e o desenrolar da amizade das duas adolescentes, por outro lado
deixa a desejar por não mostrar ao espectador como era a vida de cada uma antes
desse encontro, ou melhor, da Tracy até acompanhamos algumas coisas, mas não o
suficiente para tornar mais impactantes as cenas que marcam sua mudança
comportamental.
O roteiro foi escrito pela própria diretora em parceria com Nikki
Reed que colaborou muito trazendo experiências que ela própria vivenciou. Seus
pais se divorciaram quando ela ainda era muito pequena e a atriz foi criada
pela mãe. Até os doze anos ela era uma garota meiga e comportada, mas depois se
tornou rebelde e refém de problemas emocionais que trataram de afastá-la da mãe
e aproximá-la dos vícios e do sexo. Após a fase conturbada, Nikki aos quatorze
anos conseguiu sua emancipação e transformou as lembranças de seu passado
recente em um roteiro cinematográfico. Curiosamente, ao ser escalada para o
elenco a atriz e escritora acabou ficando com um papel oposto ao que viveu na
vida real. Algumas pessoas apontam que as situações apresentadas no longa não
são totalmente críveis e não chocam como deveriam. Bem, é obvio que outros
filmes deste tipo do passado foram bem mais além, até ultrapassaram limites em
alguns casos, mas é admirável as escolhas que Catherine fez. Não é preciso
nudez e escatologia para causar impacto. Um texto forte já é o bastante para
dar o recado, ainda mais com um elenco afiado para defendê-lo. Rachel e Nikki
estão perfeitas em seus papéis. Mesmo já tendo passado dos treze anos de idade
na época das filmagens elas incorporaram com perfeição as adolescentes
problemas e a relação delas tende a certa altura parecer tão natural que nem
nos importamos em ver duas jovens trocando carícias e provocações no ápice da
loucura.
Este filme tem como protagonistas garotas novinhas, mas não há
como negar que boa parte da força do longa se deve ao talento da jovem veterana
Holly Hunter que alterna a mãe carinhosa e compreensível com a mãe rígida que
busca talvez tardiamente descobrir onde errou na criação da filha acompanhando
a degradação da mesma. Na balança do amor e do ódio, a relação delas pende para
o lado negativo da situação sendo que a solução para o conflito aparentemente
seria o afastamento de Evie que não perderá a chance de trair a amiga quando se
sentir pressionada, afinal não existe um laço concreto de amizade entre elas ou
pelo menos por parte de uma. As cenas finais com diálogos intensos e
apresentada quase em preto e branco reforçam o aspecto documental do longa que
opta pela aparência realista através de ângulo ousados ou tremidos de câmera
para se destacar do visual limpo das produções hollywoodianas e ainda flertar
com a estética do cinema alternativo. Podem dizer que é uma produção fraca, mas
quando chegamos ao final de Aos Treze percebemos seus reais objetivos:
não apresentar respostas mastigadinhas para ajudar quem passa por situações
semelhantes, mas sim servir como um ponto de apoio para o diálogo entre pais e
filhos, estudantes e educadores para prevenir ou tentar remediar problemas. Uma
conclusão muito clichê essa? Pode ser, mas infelizmente ainda necessária para
uma sociedade metida a moderninha, mas cujos integrantes ainda mal sabem
dialogar e pensar por conta própria.
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