Meryl Streep usou roupa dourada para receber seu terceiro prêmio da Academia de Cinema em 2012. Coincidência ou não, a mesma cor ela usou anos atrás em seu vestido quando ganhou seu segundo Oscar por A Escolha de Sofia (1982), uma bela obra que se passa nos tempos do nazismo, mas a narrativa não se concentra apenas nos fatos históricos e se preocupa em enfocar os dramas de seus personagens, principalmente da protagonista após o triste período que marcou a Segunda Guerra Mundial. Segredos, culpas, tristezas, mágoas, tudo isso se mistura neste apoteótico filme do cineasta Alan J. Pakula, responsável também pelo famoso Todos os Homens do Presidente, onde não só o elenco brilha, mas também há espaço para a equipe técnica mostrar seu competente trabalho. Não é a toa que o longa foi indicado a diversos prêmios e Meryl venceu praticamente todos os prêmios da temporada. Aliás, sua interpretação chegou a ser considerada por uma cultuada revista a terceira melhor atuação feminina da história do cinema e o filme frequentemente é lembrado em listas dos melhores de todos os tempos.
A história se passa em 1947 quando Stingo (Peter MacNicol), um jovem aspirante a escritor, vai morar no Brooklyn na pensão de Yetta (Rita Karin), onde conhece Sofia (Meryl Streep), sua vizinha de quarto, uma polonesa que foi prisioneira em um campo de concentração. O rapaz também faz amizade com o namorado dela, Nathan (Kevin Kline), um carismático judeu americano dono de um instável temperamento. Rapidamente eles se tornam amigos, mas Stingo no início não tem a menor idéia dos segredos que a moça esconde e nem mesmo da insanidade de seu companheiro. O casal frequentemente tem brigas sérias, Nathan sai de casa, mas volta no dia seguinte como se nada tivesse acontecido e é aceito pela companheira. O escritor acaba se envolvendo nas situações por causa dos delírios do amigo que chega a suspeitar de um romance entre ele e Sofia e também porque a própria passa a procurá-lo para desabafar sobre sua triste vida no presente e também a respeito de seu passado doloroso.
Durante boa parte do filme parece que a escolha presente no título se refere entre a decisão que a misteriosa polonesa precisa tomar entre os dois homens com quem se relaciona. Bem, em partes também é, mas a história vai além. Pouco a pouco, Stingo vai conhecendo mais profundamente as razões de Sofia suportar tanto sofrimento e humilhações de Nathan e as verdades começam a vir a tona através das reminiscências dela sobre a guerra e sua passagem por um campo de concentração em Auschwitz. Ela foi enviada para lá junto com seus dois filhos pequenos e foi forçada a escolher um deles para ser poupado. Perante uma decisão que nenhuma mãe gostaria de tomar, ela se desespera e se nega a dar uma resposta até que tem as crianças arrancadas de seus braços. Nesta situação está a resposta para todos os segredos do casal. Dessa forma, o filme acaba tratando de um assunto de suma importância mostrando através de mais um ponto de vista os resultados que os traumas da época da Segunda Guerra Mundial deixaram para os sobreviventes.
Este enredo é desenvolvido em aproximadamente duas horas e meia de projeção até chegarmos a um final impactante. Pode parecer muito tempo, mas o roteiro consegue emocionar e intrigar o espectador de tal forma que dificilmente dá vontade de desgrudar os olhos. Os personagens são totalmente verossímeis e repletos de sentimentos adversos que pouco a pouco vão sendo revelados. Nathan é um catalisador de emoções com todas as suas nuances de temperamento enquanto Sofia se revela fria e submissa. Parece que estão juntos por comodismo, como se um fosse o porto seguro do outro apesar das diferenças de comportamento. Stingo aparentemente é o mais equilibrado e por isso mesmo fica atento para compreender a personalidade e sentimentos de seus amigos, por isso mesmo faz as vezes de confidente. É curioso que os três personagens são fortes e profundos e seus intérpretes apresentaram ótimos trabalhos, mas somente Meryl conseguiu manter sua carreira em ascensão e com vitalidade. Aliás, hoje o longa é lembrado muito mais por sua atuação que qualquer outro elemento, até porque ela usou sotaque polonês, emagreceu bastante e chegou a raspar os cabelos, tornando sua criação inesquecível. Conhecida pelo seu perfeccionismo em compor tipos, a atriz consegue sem mesmo falar, apenas com gestos e olhares, transmitir uma carga de emoção inexplicável. Vale lembrar que Pakula evitou direcionar as ações dos artistas, abrindo espaço para que eles sentissem a intensidade de seus papéis e os interpretassem da maneira que desejassem. Bons tempos em que a arte no cinema não se resumia somente a plasticidade, mas também plenamente no campo emocional.
Baseado no livro homônimo de William Styron, o roteiro foi adaptado pelo próprio Pakula com foco nos personagens e não tentando ser uma obra didática sobre um episódio histórico. Temos a visão da época ao mesmo tempo em que nos envolvemos com o desenvolvimento do trio central em um período posterior, o que potencializa o efeito impactante do texto original que, ao que tudo indica, não sofreu modificações drásticas para chegar aos cinemas. Com tal enredo extremamente interessante, interpretações inesquecíveis e ainda o fato do título até hoje ser lembrado pelos especialistas em cinema como uma obra-prima, é inexplicável que A Escolha de Sofia não esteja disponível no mercado. Mesmo com todo o sucesso de Meryl trinta anos depois deste marco, nenhuma distribuidora se dignou a correr atrás dos direitos autorais para disponibilizar o longa que independente de ter envelhecido ou não em seu visual, o que importa é sua mensagem, ainda mais daqui para a frente, afinal a cada ano que passa mais sobreviventes do triste período retratado morrem e a história mundial se enfraquece. A sétima arte teria um papel fundamental para a recuperação destes registros, mas é uma pena que hoje a preocupação seja com firulas e estrondos compatíveis com aparelhos de última geração e até trabalhos do passado estão passando por metamorfoses para entrarem nessa. Enquanto isso, as produções mais intimistas e reflexivas que não se beneficiariam dessas modernidades, até porque seu público alvo não está atrás disso, continuam no limbo.
2 comentários:
Revi esse filme dias atrás e só posso dizer: mágico. Streep ao pé da letra, ou seja, talento e maestria.
Grande atuação para uma grande história.
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