Quem nunca ouviu falar que a cultura pode
mudar um ser humano e a longo prazo quiçá o mundo? O cinema e a literatura
obviamente são dois caminhos prazerosos para isso, mas o efeito positivo da
junção dessas duas manifestações artísticas pode ser ainda mais avassalador
como nos prova Balzac e a Costureirinha Chinesa (2001), um belo drama com pano
de fundo histórico dirigido por Sijie Dai, um chinês radicado na França. O
longa é baseado no livro homônimo do próprio cineasta, uma autobiografia
retratando o final de sua adolescência quando passou por um processo de
reeducação em um povoado escondido entre as montanhas. Saber criticar, opinar e
ter uma ampla cultura sempre foram empecilhos aos regimes totalitários. No
filme acompanhamos alguns jovens que driblam as adversidades para enriquecerem
suas mentes e assim consequentemente tornam-se ameaças às regras governamentais
do final dos anos 60 e início da década seguinte.
Nos anos 70, Luo (Chen Kun) e
Ma (Liu Ye) são dois jovens que vivem na China comandada por Mao Tsé-Tung. Os
dois são encarados como sendo inimigos do povo por seus pais serem médicos e
dentistas, considerados burgueses reacionários. Luo e Ma são presos e
encaminhados a um campo de reeducação em uma vila isolada no Tibet. Mesmo sem
preparo físico, eles são obrigados a realizar tarefas pesadas como forma de
aprenderem o que realmente é importante nesta vida segundo dita o governo, ou
seja, o trabalho forçado e a obediência à uma hierarquia firmemente
estabelecida. No campo eles apenas encontram alívio nas músicas tocadas por Ma
e nas histórias narradas por Luo, até que conhecem uma costureirinha (Zhou Xun)
por quem ambos se apaixonam. Ela então lhes revela um precioso tesouro: livros
considerados subversivos e de autoria de pensadores como Flaubert, Tolstói,
Victor Hugo e Balzac, que estão de posse de Quatro Olhos (Wang Hongwei), outro
jovem que também está sendo reeducado e está prestes a retornar à cidade. O
trio então decide por roubá-los para promoverem suas próprias revoluções
pessoais.
Mao Tse Tung governou a China e empreendeu a
Revolução Cultural, uma espécie de lavagem cerebral e desumana coletiva. Ser
uma pessoa com censo crítico e culta era muito inconveniente para os regimes
totalitários que queriam comandar a população, portanto a ignorância do povo
era tudo o que precisavam e um trabalho incessante semelhante ao dos tempos da
escravidão era a maneira mais eficaz de se conseguir isso. Situações semelhantes
assolaram vários países inclusive o Brasil na forma da Ditadura Militar. Quem era contra o governo
acabava se manifestando através das artes e da cultura, correndo o risco de
sofrer terríveis consequências, assim esses regimes políticos acusavam os
intelectuais de serem inimigos do povo. No território chinês a tal revolução
que Mao impôs levou ao fechamento das universidades e os jovens eram enviados
ao campo para aprenderem os valores que o governo julgava corretos para a
construção de uma nação direita.
No filme o
processo de superação dos três protagonistas acaba por se refletir na vida
daquelas pessoas humildes da aldeia em que viviam, um povo que propagava ideais
revolucionários sem mesmo saber o que eles significam. Esses personagens
"mais evoluídos" querem descobrir o que o mundo tem a oferecer, mas
precisam fazer tudo as escondidas para não sofrerem ainda mais repressão. Nessa
espécie de campo de refugiados, onde as pessoas são obrigadas a fazerem
serviços pesados sem terem o menor preparo físico muitas vezes, os jovens
conseguem entrar em contato com a cultura mundial através dos livros que outro
rapaz traz as escondidas. Aí está a grande idéia do roteiro: é uma verdadeira
homenagem a literatura e a grandes nomes de pensadores. Vendo por esse
contexto, o longa faz um incentivo ao hábito da leitura, mostrando o quanto ela
é importante para o crescimento intelectual.
Geralmente os filmes de drama orientais causam
impacto pelas espetaculares imagens que mostram belíssimas passagens, figurinos
e cenários, mas aliados a um excelente roteiro podem se transformar em obras de
importância ímpares. Com fotografia e locações de encher os olhos, esta
produção é um belíssimo exemplar de amor e contemplação as artes, porém, mais
uma vez a lei do mercado fez valer a sua força. Se não há demanda não há oferta
e vice-versa. Por desinteresse do público ou pouco caso das distribuidoras Balzac
e a Costureirinha Chinesa é mais um excelente filme esquecido e fora do
mercado atual.
Um comentário:
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